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Richard Zenith: “Fui descobrindo até que ponto Pessoa, afinal, era humano, como tu e como eu”

Richard Zenith é escritor, tradutor, investigador e um dos mais destacados especialistas da vida e obra pessoanas. No dia 7 de Maio, vai estar no MAP para uma masterclass em que se propõe a “reflectir sobre o rico universo pensativo, emocional, espiritual e mesmo sexual que Pessoa construiu e habitou com palavras”. Em antecipação desse momento, Nuno Miguel Guedes esteve à conversa com o escritor.

NMG: O Richard é um dos mais apaixonados e dedicados “pessoanos” da actualidade. Como e porquê começou essa paixão?
Fiquei bastante deslumbrado pelos primeiros poemas de Pessoa que alguém me mostrou no final dos anos 70, quando tinha 22 anos de idade. Eram poemas assinados por Alberto Caeiro e Álvaro de Campos. Podia compreendê-los graças ao espanhol, que eu já falava. O meu interesse em Pessoa cresceu em flecha durante os três anos em que vivi no Brasil, onde aprendi o português. Foi em Portugal que li o Livro do Desassossego pela primeira vez e resolvi traduzi-lo para inglês.

NMG: Podemos considerar que essa dedicação ao universo “pessoano” é também um amor à língua portuguesa? Isto apesar de Pessoa também ter escrito em inglês…
Eu diria que a minha atracção por Pessoa se relaciona, em primeiro lugar, com o meu amor pelas palavras, indepentemente de qualquer língua. Sinto, é verdade, uma grande paixão pela língua portuguesa – devido em parte ao seu som e em parte a escritores como Camões, Pessoa, João Guimarães Rosa e tantos outros.

NMG: Recentemente publicou uma extraordinária biografia do poeta: “Pessoa: an experimental life”. Tanto o indivíduo como a obra apresentam uma galáxia de outros indivíduos e se calhar outras tantas obras. Optou por algum fio unificador para a biografia para além do facto de ser o mesmo indivíduo?
Uma vez que Pessoa é tantas pessoas e sempre em movimento, nunca estável, achei melhor seguir uma linha cronológica. Há vários fios – Pessoa o amante da literatura, o patriota preocupado pelo seu país e pelo mundo, o buscador espiritual, o ser sexual inquieto, impossível de definir – que se vão entrelaçando ao longo da história que tentei contar com alguma objectividade, sem impor uma leitura única.

NMG: Quais os aspectos que mais o surpreenderam ou gratificaram ao fazer esta biografia?
Fui descobrindo até que ponto Pessoa, afinal, era humano, como tu e como eu, mas ao mesmo tempo alheio a este mundo. É conhecido por ser um poeta cerebral e esta desginação cabe-lhe bem, mas é incompleta, pois Pessoa, que pensava e analisava constantemente, sentia com ainda mais intensidade.

NMG: O que poderemos esperar da sua masterclass?
Falarei da relação especial que Fernando Pessoa tinha com a palavra, que lhe ajudou a defender-se num mundo onde se sentia mal adaptado. A palavra servia-lhe como chave ao imaginário literário, a domínios espirituais e ao conseguimento de uma certa perfeição, uma imortalidade provisória.