A Garota Não (nome artístico de Cátia Oliveira) é uma das mais entusiasmantes vozes da música portuguesa. Lançou recentemente “2 de Abril”, um disco que revisita e homenageia o bairro de Setúbal onde cresceu e que a tem levado a tocar um pouco por todo o país. Afirma que “gosta de cantar e sobretudo de escrever”, e isso sente-se na energia com que se apresenta em “Os Surrealistas”. Aproveitámos o lançamento de “Os Surrealistas” para saber como é que surgiu esta colaboração.
A Palavra: Como é que surgiu a oportunidade de participar neste disco?
A Garota Não: Foi um convite que assim que chegou me deu uma grande satisfação. Conheci a Paula Cortes nas Quintas de Leitura do Porto, gostei logo muito dela, da força e da sensibilidade que traz a tudo. Poucas semanas depois conheci o José Anjos e daí a nada o Alex Cortez… e fomo-nos dando todos bem. Entretanto estava a trabalhar com o Fred Pinto Ferreira em algumas composições que fizemos em conjunto e ele deve ter-lhes mostrado alguma coisa, e vai daí nasce a provocação irrecusável, que foi fazer parte deste disco tremendo.
A Palavra: Foi difícil encontrar pontos comuns entre o universo surrealista da LPO e d’A Garota Não?
A Garota Não: Nada. Temos uma estética muito diferente mas encontramo-nos no essencial: um grande respeito pela palavra. Na sua plasticidade, na besta e na calmaria que contém. No cuidado de se criar o ambiente que melhor a sirva, sem a perdermos no meio dos arranjos e das instrumentações. Eu acho que a LPO faz isso deliciosamente, numa combinação que ora nos sossega e alinha o ouvido, ora nos tira o tapete e vira de repente para outra coisa qualquer meio alucinada.
A Palavra: O que a motivou a aceitar esta colaboração? É um desafio diferente de fazer música sozinha?
A Garota Não: Eu começo as músicas sozinha mas nunca as acabo sozinha, porque no fim tenho sempre a ajuda do Sérgio Mendes, com quem trabalho na produção dos temas. Mas sim, no início é sempre um processo muito solitário e interior. E que adoro. Mas também adoro ser desafiada a fazer coisas como as que fiz com LPO. Eles puxam pelo nosso lado mais destemperado, menos racional. E não é que hoje em dia seja difícil ou raro sermos destemperados. O difícil é fazê-lo com elegância e bom sentido de humor. E nisso eles são fabulosos.
A Palavra: Se pudesse escolher um poema para cantar com a LPO, qual seria?
A Garota Não: Poderia escolher vários da Francisca Camelo. O livro dela “A importância do Pequeno-almoço” tem pelo menos 3 punhados cheios de possibilidades.